Teatro
do Absurdo
a mulher que come
livros – cena 1
Federico - come
vento menina come vento. não há mais metafísica no mundo do que comer vento
Clarice
-
prefiro chocolate
Federico - mas
isso aí é um livro
Clarice
-
não faz mal, é como se fosse
Federico - como
se fosse é muito vago
Clarice
-
pode ser vago pra você mas para mim não é
Federico - você
é muito estranha
Clarice
-
estranha por quê?
Federico
-
parece até que come livros!
Clarice - e o
quê você tem com isso? te incomoda?
Federico -
calma, não precisar se irritar!
Clarice
-
mas quem disse que estou irritada?
Federico - do
jeito que você fala!
Clarice
-
e você queria que eu falasse como?
Federico -
normal
Clarice - mas
eu falo normal como eu falo esse é o meu normal de falar. Se não está gostando dá licença, e para de
fazer perguntas.
Federico -
grossa!
Clarice - não
gosto de muitas perguntas. sou assim mesmo
Federico
-
mas não precisa xingar!
Clarice - e
quem foi que xingou?
Federico - se
não xingou foi quase
Clarice - me
deixa em paz. que eu quero terminar de comer meu livro
Federico - é
doida, comer seu livro?
Clarice
-
modo de dizer. já te disse sou assim mesmo
Federico -
assim mesmo como?
Clarice
-
gosto de comer livros, romances, ficção, principalmente poesia
Federico -
quero dizer que ainda arde tua manhã em minha tarde
Clarice - nem
vem que não tem
Federico - nem
tem o quê?
Clarice - essa
cantada barata
Federico - tua
noite no meu dia
Clarice - vai
insistir?
Federico - tudo em nós que já foi feito com prazer
ainda faria
Clarice - o
que nós já fizemos? tá doido?
Federico -
quero dizer que ainda é cedo ainda tenho um samba/enredo
Clarice
-
fique sabendo que prá mim é tarde
Federico
-
tudo em nós é carnaval é só vestir a fantasia
Clarice
-
detesto carnaval
Federico - quero
ser teu mestre sala e você porta/bandeira. quando chegar a quarta-feira a gente
inventa outra folia
Clarice - você
quer fazer o favor de me deixar de comer meu livro
Federico
-
vai me dizer que não gostou?
Clarice
-
detestei. cantada barata igual a essa eu
já ouvi de um monte
Federico -
duvido!
Clarice -
então fica aí com a sua dúvida por quê quanto a isso eu não tenho nenhuma. e me
dá licença que eu vou terminar de comer meu livro
(lendo o livro) come chocolate menina, come chocolate. não
há mais meta física no mundo do que comer chocolate.
Teatro
do Absurdo – A Mulher Que Come Livros
A Mulher Que Matou os peixes
Cena 2
Federico - ei
vai pra onde?
Clarice – vou
ali terminar de comer meu livro
Federico – come
aqui mesmo
Clarice –
então para de me fazer perguntas
Federico – não
posso
Clarice – não
pode por quê?
Federico
–
porque sou curioso
Clarice –
curiosidade mata
Federico – você
é a mulher que matou os peixes?
Clarice – na
outra vida, outra encarnação
Federico – e
você acredita nisso?
Clarice –
claro que acredito, tanto é que estou aqui. E agora não mato peixes, agora como
livros. E para comer livros não preciso matar, basta guardar, preservar, para
ler na hora que tenho vontade.
Federico – mas
por quê você tem vontade de comer livros?
Clarice
–
para me enriquecer de conhecimentos, informações, ter contato com os sentimentos
dos outros e as suas visões de mundo.
Federico
–
mas isso a gente encontra no carnaval – no desfile das Escolas de Samba por
exemplo
Clarice
–
mas eu já lhe disse, detesto carnaval
Federico
–
Isso porque você nunca viu. Nunca foi na marquês de Sapucaí
Clarice – não
muda de assunto não, e acho bom você me deixar terminar de comer meu livro
Federico
–
a fome é tanta assim?
Clarice
–
fome, sede, desejo tudo junto misturado
Federico
–
você não sabe fazer outra coisa não?
Clarice –
procuro... procuro mas não encontro, outra coisa que me dê tanta satisfação
como comer livros! E acho que você deveria fazer o mesmo.
Federico
–
tá doida. Era só o que me faltava eu um Mestre/Sala da Mocidade Independente de
Padre Olivácio a Escola de Samba Oculta no Inconsciente Coletivo, comendo
livro!
Clarice – e
qual é o grande problema nessa questão, eu por exemplo. Já matei os peixes,
hoje como livros. Não vejo nenhuma contradição. Porque você que se diz
mestre/sala não pode comer um livro?
Federico
–
simplesmente porque gosto do movimentos dos corpos sambando na avenida
Clarice – mas
isso é muito pouco – eu gosto de comer livros porque cada coisa tem o instante
em que ela é, e eu quero me apossar do é da coisa. E para mim corpos em
movimento na avenida não significa coisa alguma. Não vejo graça nenhuma em
carnaval.
Teatro
do Absurdo – Hermínia A mãe da mulher que come livros - cena 3
Hermínia, mãe de
Clarice, anda de um lado a outro do
palco, apavorada porque Clarice não come mais nada, a não ser livros.
Hermínia - Essa
menina vai me enlouquecer, não almoça, não lancha, não janta, só quer saber
que comer livros. (grita); Clarice!
de algum lugar Clarice
responde:
- que é minha mãe, a senhora quer fazer o favor de me deixar
em paz para continuar a comer meu livro!
Hermínia -
Clarice, você já almoçou ou fez um lanche pelo menos? Não pode ficar o dia
inteiro sem comer nada. Você sabe que pode comer tudo, só não pode comer
alimentos que contenham glúten.
Clarice - Pois
é mãe, livros não têm!
Hermínia -
daqui a pouco você adoece e aí?
Clarice - E aí
o quê?
Hermínia - e
aí, que eu desempregada sem salário, num sufoco que só Deus sabe. Nem farmácia
popular temos mais, o golpista acabou com todos os programas sociais. Como eu
vou me virar com você doente? Eu morro.
Clarice
–
não se desespere mãe amanhã será outro dia
Hermínia – mas
esse outro dia está demorando, muito a chegar
Clarice
–
está logo ali mães, na rama do planalto, dia 1 de janeiro ele chega
Hermínia
–
ele quem?
Clarice
–
ele mãe que está c antado na música e no livro do Chico, estou procurando aqui
para comer mas não estou encontrando
Hermínia – com
certeza os neonazistas genocidas devem ter queimado na fogueira
Clarice – mas
não é possível ontem mesmo este livro estava aqui
Hermínia
–
mas eles são assim mesmo., chegam as ocultas na calada da madrugada, as vezes
antes mesmo do amanhecer e no cercadinho do planalto acendem as fogueiras da
ignorância
Gigi e
Federika – Teatro do Absurdo A Mulher que come livros – cena
4
Gigi –
Federika você viu que coisa estranha?
Federika – o
que é Gigi, você está igual ao Federico não para de fazer perguntas.
Gigi –
aquela mulher que come livros
Federika – deve
estar com fome, não tendo nada para comer a saída é comer livros- ao invés de
comer vento
Gigi – mas
será que ele não tem nada para comer em casa, coitada!
Federika
–coitada nada, cada um mata a fome com o que tem.
Gigi –
crueldade!
Federika
–
crueldade por quê?
Gigi - Uns
com tanto outros com nada
Federika
–
mas ela tem uma quantidade enorme de livros
Gigi – mas
será que comer livros mata a fome?
Federika
–
lá vem você com perguntas novamente
Gigi – o que a gente não sabe tem de perguntar mesmo
Federika – a
vida é uma audaciosa metáfora
Gigi – que
m te disse isso?
Federika –
EuGênio, li no livro dele Invasão dos Corpos
Gigi – será
que é este livro que a Clarice está comendo?
Federika – acho
que não porque esses dias ela estava lendo A Paixão Segundo G H
Gigi –
nunca li
Federika – mas
devia para deixar de fazer tantas perguntas
Gigi – você
conhece ele?
Federika
–
Quem?
Gigi –
EuGênio, o autor do livro
Federika – claro
que conheço ele mora lá em casa. Mas o livro dele não é A Paixão Segundo G H,
esse é da Clarice Lispecto. O livro dele é Invasão dos Corpos, uma estória
sobre discos voadores que acontece na cidade de Jardinópolis
Gigi – meu
Zeus que loucura !
Federika
–
loucura nada a Vida é uma audaciosa metáfora
Gigi – mas o
que é metáfora?
Federika
–
figura de linguagem
Gigi – mas
isso é muito vago
Federika – está
repetindo o Federico, para ele tudo é muito vago, menos a Mocidade Independente
Gigi – eu
também adora a Mocidade. Amo
Federika – por
quê?
Gigi –
porque sou a Rainha!
Federika
–
Rainha?
Gigi – é
Rainha da Bateria, eleita pela décima segunda vez consecutiva
Federika
–
mas você nem sabe sambar
Gigi – e
quem disse que pra ser Rainha de Bateia precisa saber sambar
Federika
– e não precisa?
Gigi –
claro que não basta ser a garota do patrono
Federika
–
deixa eu entrar e terminar de ler O Homem Com A Flor Na Boca porque essa
conversa está ficando muito esquisita
Teatro
do Absurdo 2
A Invasão Cibernética em Jardinópolis
Cena 5
Bruna e Bárbara. travam uma cena de ciúmes movidas pela
mesma paixão por Federico Baudelaire
Bruna - viu o
que você fez?
Bárbara - fiz
o quê?
Bruna - não
se faça de sonsa, você olhou pra ele!
Bárbara - e
agora até olhar é proibido?
Bruna - não.
não é, mas ele é meu!
Bárbara - tem
escritura da sua propriedade ?
Bruna - não é
necessário, porque ele também sabe!
Bárbara - ele
quem?
Bruna - não
se faça de besta que você viu muito bem pra quem você olhou!
Bárbara - até
então acho que olhar é um ato de liberdade. eu olho para tudo!
Bruna - mas
para ele não pode
Bárbara - só
porque você quer
Bruna -
quero mesmo, quero e posso!
Bárbara
-
vai ficar querendo. porque jamais vai poder me impedir de olhar para onde eu
quiser
Bruna - se o
disco voador passar aqui novamente e você olhar para ele, juro que te mato.
Bábara - vai
ficar jurando, os tempos de Calabar já se foram querida!
Bruna - Cala
a boca Bárbara!
Bárbara
-
ele sabe dos caminhos dessa minha terra. nos meus braços se escondeu!
Bruna - pode
debochar, depois não vá dizer que não avisei
Bárbara - nas
bandeiras seus lençóis, nas trincheiras tantos ais, no meu corpo tanto cais!
Bruna - suas
tempestades não me interessam, e o seu olhar, sou eu quem digo para onde deve se
dirigir.
Bárbara - vem
meu menino vadio, vem sem mentir pra você
Bruna -
Canta, canta, pode cantar porque depois vai chorar na cama
Bárbara -
vem... vem... vem... e me leva no seu disco voador seja para marte, ou seja lá
para onde for.
Bruna -
sonha. sonha que ele vai te levar, porque
daqui você não sai, vai ficar aqui comendo vento, porque quem vai com ele sou
eu...
Teatro
do Absurdo -
3 mulheres à beira de um ataque de nervos
Cena 6
Marisa está na ponta de uma mesa olhando para o fundo de
uma caneta vazia como se olhasse no Espelho
Marlise está na
outra ponta da mesa com um prato cheio de carne
Dadete - está
num canto da cozinha com uma vassoura varrendo o chão
Marisa - meu
manto. meu manto! (olhando no fundo da caneta) você viu meu manto meu gato?
Isso é coisa do Saraiva, mim mesma acha que um Bispo do Rosário baixou por aqui
Marlise -
danou-se tem gente que enlouquece e vive falando sozinha
Dadete -
ainda se fosse e falasse a língua dos homens, no Rio Grande estão comendo até
cachorro de Bispo
Marisa - não
sou profeta mas tenho premonições, previ que os chineses iriam descobrir a
pólvora e fabricar papel
Marlise
-
vai dizer também que previu que eu iria ser gordinha?
Marisa -
Claro comendo carne desse jeito, não poderia star de outra forma
Dadete - no
Rio Grande come-se até as Dunas
Marisa - ainda
se fosse as do Barato vá lá. Mas comer areai branca ninguém merece
Marlise- eu
como o que posso, e o que não posso deixo pra lá. No outro Rio Grande tem um
ditado que diz que cada um come o que tem.
Dadete- o
corpo, pronto eu como o corpo, e não deixo nada pro vento, as dunas são
testemunhas do quanto eu gosto de comer o corpo
Marisa - mim
mesma não está comendo nada, nem Edmilson na feira de São Cristóvão. Aliás, mim
mesma tem andado de dieta pra lua, só bebe água e cheira vento
Marlise -
cruzes! se eu fizesse isso desmaiava na primeira tempestade de areia.
Dadete-
claro, nunca vi gostar tanto de boi. cuidad0 boi demais pode dar febre suína
Marisa - essa
não Dadete, como comer boi pode dar febre suína?
Dadete - no
Rio Grande nas dunas teve um caso dessa na praia do Peró. A mulher do delegado
comeu um boi e acordou roncando que nem uma porca.
Marlise - No
Arraial do Cabo também aconteceu, porque lá tem a mesma praia do Peró, ecom a
mesma mulher do delegado aconteceu a mesma coisa.
Marisa - bem
que mim mesma previu, que coincidências
acontecem não por meras semelhanças, mas por falta de marido mesmo
Dadete - ô
mim mesma, o que tem uma coisa a ver com falta de marido?
Marisa - Claro
que tem, mim mesma mesmo me disse quando me viu jogada no chão: - quando nasci
um anjo torto veio ler a minha mão!
Marlise - mim
mesma é cartomante!?
Dadete- não
ela joga búzios e lê a sorte em cartas de tarô!
Marisa - nada
disso, mim mesma é chegada a uma borra de café. No fundo da xícara ela lê tudo
o que já aconteceu e o que virá a acontecer com milênios de antecedência
Marlise - e o
vento leva?
Dadete - o
vento sempre me leva pro outro lado, mesmo que eu nem queira atravessar o outro
corpo que me prende nesse lado da cozinha
Marisa - com mim
mesma, é quase assim também, dia desses quero ser uma grande menina de Londres,
para badalar o Big Ben
Marlise -
coitada , tá mais pra menina da Pavuna
Dadete - você
não sabe de nada Marlise. Mim mesma tem uma coisa muito estranha, na outra vez
que nos encontramos em carnaval dos copos, ela me disse que tinha jantado
Ronaldo Werneck na cachaçaria.
Marisa - mas
isso já faz tempo. passou, e me deu um enjôo daquele pensei até que tinha
engravidado!
Marlise - e
Ademir soube disso?
Marisa - Uai!
e porque ele teria de saber?
Dadete -
claro que sim, ele tinha que saber, pois não é ele que te leva pra Cachaçaria?
Marisa - me
leva mas me larga lá entregue a fome, se eu não me virar com o que tem morro de
desejo. Mim mesma sempre me disse: - em momentos como esse não se apavore nem
tenha ataque de nervos, se vira como pode. - eu que não sou besta não deixo o
vento passar despercebido, me agarro em suas crinas e meto os dentes nele.
Marlise- comer
vento? coisa de mim mesma mesmo. Não tivesse eu umas carninhas sempre a
disposição, minhas gordurinhas desapareciam todas num piscar de olhos.
Dadete - é
por isso que no Rio Grande está desaparecendo
vento. Quando consegue passar por lá mim mesma estraçalha tudo
Marisa - mas
também não é bem assim, tudo tem seu vento certo, e os nervos só se acalmam com
umas dentadas bem dadas no lado esquerdo da tempestade quando a ventania
passa...
- do outro lado da casa ouve-se um grito: Mim mesma! - as 3
mulheres se desfazem num segundo e desaparecem no vento
Teatro
Do Absurdo – A Mulher Que Come Livros –
Cena 7 - Invasão dos Corpos
EuGênio
- porra esse vento hoje tá foda, já destelhou a minha telha, apagou a minha
trilha e essas minas caretas que nem sabe que eu existo, ficam aí
conversando com fantasmas.
(dirigindo-se para
Zelda, que encontrava-se distraída
olhando para o teto ao lado da parede lateral esquerda quase no fundo do palco) ei você? quem é?
Zelda
Scot
- Zelda, estou aqui porque procuro um livro que me indicaram para ler, mas não
estou encontrando, e uma amiga me disse que é o máximo, fala sobre uma invasão.
EuGênio
- besteira, invasão nenhuma,
tenho certeza que o livro que elas leram é ficção. acredita nisso não!
Zelda
Scot
- mas Clarice minha prima, está tão impressionada que ela come o livro de tanto
que lê.
EuGênio
-
ela deveria estar comendo outras coisas e não livro. Livro é lá coisa que se
coma?
Zelda
Scot
- mas é melhor comer livro do que comer vento, como tenho ouvido dizer que está
acontecendo no Rio Grande
EuGênio - ah!
isso deve ser notícias dessas redes sociais, é tudo fake, tem nada disso não.
você acredita no que lê no Whatsapp por
exemplo?
Zelda
Scot
- em alguma coisa que leio sim, como não vou acreditar?
EuGênio - essa
onda agora da exposição censurada pelo Santander lá no Rio Grande você já leu?
Zelda
Scot
- censurada por quê?
EuGênio - um bando de imbecis, babacas, idiotas que se
dizem do MBL ( Movimento Brasil Livre) fizeram manifestações fascistas chamando
as obras expostas de "arte degenerada", classificando-as de pedofilia
e zoofilia
Zelda
Scot
- nem sei do que se trata!
EuG~enio - você
precisa saber, leia meu livro querendo te empresto
Zelda
Scot
- fala sobre o quê?
EuGênio -
Invasão de corpos!
Zelda
Scot
- ah! então é você o EuGênio Mallamè e?
EuGênio - Muito Prazer! estamos aí por toda cidade
espalhando em suor a felicidade!
Zelda Scot -
mas isso não é muito perigoso? Invasão de Corpos?
EuGênio -
Mas desde Guimarães Rosa, que viver é muito perigoso, mas ficção é só ficção, e
como dizia Belchior: isso é apenas uma
canção, a vida realmente é diferente ao vivo é muito pior?
Zelda Scot - Mas
é um livro ou uma canção?
EuGênio - Se quiser saber mesmo só ir me encontrar
a noite no Bar do Chico, aqui não dá para explicar!
Zeld Scot - por
quê? o livro é um livro proibido?
EuGênio -
Não, o livro não é proibido mas a carne pelo preço que está, essa sim é
proibida
Zelda Scot -
então está bem nos encontramos a noite no Bar do Chico.
EuGênio -
Não chegue antes da meia noite, porque senão não poderei explicar também
Zelda Scot -
está bem chego depois da meia noite
EuGênio -
depois que todos forem dormir ...
os dois e abraçam e saem de mãos
dadas pelo fundo do palco
Teatro
do Absurdo – A mulher que come livros
Cena 8
Vagner -
Clarice!
Clarice
-
o que é Vagner
Vagner - o
que tanto lê aí nesse estranho livro?
Clarice - é
sobre a possibilidade de uma invasão cibernética que vai acontecer em 2020
Vagner -
Pirou?
Clarice
-
não é o que o cientista está dizendo aqui?
Vagner - qual
é o nome dele?
Clarice -
Federico Baudelaire
Vagner -
claro só podia ser ele , esse cara é louco!
Clarice
-
mas o que ele está dizendo aqui tem
lógica
Vagner -
bebeu?
Clarice - Água
Vagner - pelo
jeito acho que não foi água não
Clarice - está
duvidando de mim?
Vagner - claro
que duvido. nem te conheço direito, e você passa o tempo todo enfiada nesse
livro, escrito por um maluco, que acha que vamos ter invasão cibernética, como
não vou duvidar?
Clarice
-
mas você devia acreditar, tudo leva a crer que esta invasão pode acontecer
mesmo.
Vagner - Só
porque você quer. acho que seus neurônios já não estão funcionando muito bem
não.
Clarice - você
é um ateu não acredita em nada
Vagner - eu
acredito em muita coisa, mas não posso acreditar num absurdo desses
Clarice
-
só porque é cego
Vagner - se
fosse cego não estaria te vendo aí.
Clarice - como
está me vendo?
Vagner
-
com os olhos
Clarice
-
não foi isso que perguntei
Vagner - como
perguntou então?
Clarice - de
que maneira está me vendo, feia, bonita, linda, elegante.
Vagner - não
tem espelho não?
Clarice - mal
educado!
Vagner - não
se trata de educação, é uma questão de ponto de vista.
Clarice
-
mas não respondeu minha pergunta!
Vagner - você
se acha!
Clarice - há
muito tempo, desde que me olhei a primeira vez no espelho
Vagner - deve
ser por isso que acredita em invasão cibernética
Clarice
-
Vamos mudar de assunto, porque já está m torrando o saco essa sua conversa
Vagner - mudar
pra quê?
Clarice
-
vou tomar um banho para ir ao super mercado
Vagner
-
quanta vaidade! precisa tomar banho para ir ao super mercado?
Clarice
-
questão de higiene meu caro!
Vagner - boa
viagem...
Clarice sai e deixa Vagner falando sozinho...
A
Mulher Que Come Livros - Última Cena – Federico Baudelaire – Eu sou Drummundo
Clarice
me deixou vazio, de tata paixão por G H secou os meus e-mails meus inteiros, me
deixou a ver navios, me jogou em São Francisco. Poesia é risco, o poeta é um
fingidor na obra de Fernando Pessoa, mas Itabapoana é pedra pássaro pedra que
voa. Não a mulher que come livros não é apena pelo desejo de ler, mas sim pela
fome de arroz, feijão, macarrão, carne, chocolate, e também pela sede de
sobreviver dessa barbárie para onde nos empurraram desde 2016.
era
uma vez um mangue e por onde andará Macunaíma na tua carn no teu sangue na
medula no teu osso por acaso ainda existe algum vestígio de Macunaíma na veia
do teu pescoço
guima
meu mestre guima em mil perdões
eu vos peço por esta obra encarnada na carne cabra da peste da hygia ferreira
bem casta
aqui nas bandas do leste a fome de carne é madrasta
ave
palavra profana cabala que vos fazia
veredas em mais sagaranas a morte em vidas severinas tal qual antropofagia
teu grande serTão vou cumer
nem joão cabral Severino nem virgulino de
matraca nem meu padrinho de pia me ensinou usar faca ou da palavra o fazer
a ferramenta que afino roubei do mestre drummundo qyue o
diabo giramundo é o narciso do meu ser
não. não bastaria a poesia de
algum bonde que despenca lua nos meus cílios num trapézio de pingentes onde a lapa carregada de
pivetes nos seus arcos ferindo a fria
noite como um tapa
vai fazendo amor por entre os trilhos.
não. não bastaria a poesia cristalina se rasgando o corpo estão muitas meninas tentando a sorte em cada porta de metrô. e nós poetas desvendando palavrinhas vamos dançando uma vertigemno tal circo voador.
não. não bastaria todo riso pelas praças nem o amor que os pombos tecem pelos milhos com os pardais despedaçando nas vidraças e as mulheres cuidando dos seus filhos.
não bastaria delirar Copacabana e esta coisa de sal que não me engana a lua na carne navalhando um charme gay e uma cheiro de fêmea no ar devorador
aparentando realismo hiper-moderno,
num corpo de anjo que não foi meu deus quem fez
esse gosto de coisa do inferno como provar do amor no posto seis numa cósmica e profana poesia entre as pedras e o mar do Arpoador
uma mistura de feitiço e fantasia em altas ondas de mistérios que são vossos
não. não bastaria toda poesia que eu trago em minha alma um tanto porca, este postal com uma imagem meio Lorca: um bondinho aterrizando lá na Urca e esta cidade deitando água em meus destroços pois se o cristo redentor deixasse a pedra na certa nunca mais rezaria padre-nossos e na certa só faria poesia com os meus ossos.
Artur Gomes
Fulinaíma MultiProjetos
fuliaima@gmail.com
22 – 99815-1268 – whatsapp
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