sexta-feira, 22 de março de 2024

múltiplas poéticas

furo

 

o que te perfura?

uma broca

uma bala

uma faca

uma britadeira

uma falta

um insulto?

 

um poema

uma

metáfora

te

per

fu

ra

?

Yara Fers

In O Peito Perfurado da Terra

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Mostra Visual De Poesia Brasileira

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Experi/mentalismo

 

recluso na estação 353 uso tempo para exorcizar o mal secreto uilcon pereira me ensinou as sample/ações  nas sagradas escriduras de jommard muniz de britto um grito joaqum branco em sua zona de conflito:

“gigantes medonhos / arrastando a noite / clarenigma / pássaros de sonhos / aparando os olhos / negrenigma”

genocidas no congresso aprovam leis  para liberação de agrotóxicos e a gente se ferra Yara Fers e seu peito perfurado da terra:

 

“enfio as mãos na terra

para escrever o poema

 

e as mãos não estão

sujas

 

remexo o barro

as pedras

sinto os grãos

enfiados nas unhas

em simbiose

 

e minhas mãos

não se sujam

 

é a terra que está

suja de mãos”

 

adeus sementes de abóbora in-natura que mastigo para aliviar a profilaxia prostática nesse tempo estático  nada do que penso da estética  sobre a ética passeia entre meus olhos soturnos guima meu mestre guima em mil perdões eu te peço o poema pode ser um beijo em tua boca por quê trancar as portas tentar proibir as entradas ? te beijo vestida de nua comigo  ninguém pode espada de são jorge ogum de cia sputinik no quintal alegria a prova dos nove do meu cão experimental  sei por onde vou não faço parte do outro lado da parte dessa escória que enferruja a história que passou nem do diabo a quatro quando muito cito Oswald e também cito Torquato neto do meu pai se chama Dedé meu afilhado em Deus eu tenho fé um dente de alho sobre a mesa Carlos Gurgel viajou de Natal pra Fortaleza  antes do amanhecer um girassol riscado a giz o dia ainda vai raiar um poema ainda vai nascer no vai e vem dos seus quadris Cazuza pra desvendar na atual constituição qual é o nome da meretriz o homem com a flor na boca ainda desfolha a bandeira com sua língua  de trapo no  pantanal  desse país.

Artur Gomes

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O Homem Com A Flor Na Boca

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tenho dúvidas

não tenho certeza

da beleza que me segue

à beira da BR-040

desde que Tranca Rua

abriu a minha estrada

para o SerTão da Bahia

 

Artur Gomes

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poema 10

meus caninos

já foram místicos

simbolistas

sócio políticos

sensuais eróticos

mordendo alguma história

agora estão famintos

cravados na memória

 

Artur Gomes

O Homem Com A Flor Na Boca

Editora Penalux – 2023

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 Jura secreta 3 


fosse essa jura sagrada 
como uma boda de sangue 
às 5 horas da tarde 
a cara triste da morte 
faca de dois gumes 
naquela nova granada 
e Federico Garcia Lorca 
naquela noite de Espanha 
não escrevesse mais nada 

 

Artur Gomes

Poema do livro Juras Secretas

Editora Penalux - 2018 

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não sou eu mas parecia e ser bem que poderia soube que um poeta em sampa está a me olhando com olhos de desejos que me arrepiam atiçando as tentações faço de tudo para que Baudelaire não saiba pois do jeito que o Federico anda ultimamente é capaz de me esganar se desconfiar desses olhares de fogo

Rúbia Querubim
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           a cidade dos sonhos

sonhei que estava descendo em uma cidade desconhecida que nunca tinha ido e tinha uma menina me esperando - mas não consegui identificar que cidade era e nem a menina consegui reconhecer procurei na fotografia não encontrei aviste um oceano Atlântico fui à beira mar e acordei

 

Artur Fulinaíma

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 Jura secreta 2 


não fosse esse punhal de prata 
mesmo se fosse e eu não quisesse 
o sangue sob o teu vestido 
o sal no fluxo sagrado 
sem qualquer segredo 

esse rio das ostras 
entre tuas pernas 
o beijo no instante trágico 
a língua sem que ninguém soubesse 
no silêncio como susto mágico 
e esse relógio sádico 
como um Marquês de Sade 
quando é primavera 

 

Artur Gomes

Poema do livro Juras Secretas

Editora Penalux - 2018

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 O chão que nos espera

 

tem pessoas que ainda gostam de fantasias ilusões ideias que não cultivo mais a pedra pólen inda me guia quando admiro céus sóis estrelas luas cheias vez em quando pedalo até a praia a procura de ouvir o canto da seria à beira mar yemanjá e continuo caminhando nesse chão que nos espera poesia além da morte bem pra lá dos girassóis para encontrar nas pradarias a  orelha de van  gog  e seu instante em desespero não espero muito como alguém que do outro lado do oceano me espera

 

Artur Gomes

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Vampiro Goytacá Canibal Tupiniquim

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O Homem Com A Flor Na Boca

 

O ator, produtor, videomaker e agitador cultural Artur Gomes acumula uma bagagem de 50 anos de carreira com prêmios nacionais e internacionais em teatro, música, literatura e artes gráficas. Gomes poderia se filiar na tradição literária dos chamados poetas malditos, como comumente e simplistamente nos referimos àqueles autores que constroem uma obra “rebelde” em face do que é aceito pela sociedade, vista como meio alienante que aprisiona os indivíduos em normas e regras. Tais autores rejeitam explicitamente regras e cânones. Rejeição que  manifesta-se também, com a recusa em pertencer a qualquer ideologia instituída. A desobediência, enquanto conceito moral exemplificado no mito de Antígona é uma das características de tais sensibilidades poéticas, que no Brasil já vem de longe com um Gregório de Mattos e ganhou impulso e seguidores com o famoso trio da “parafernália” rebelde: Verlaine, Baudelaire e Rimbaud.

      Já tivemos oportunidade de observar em outras obras do autor, que suas construções poéticas seguem sempre renovadas para cima em matéria de criatividade, elencando uma variada diversidade temática que aborda, sempre em perspectiva ousada e radical, desde o doce e suave sentido do amor, ao cruel da relação amorosa, flertando com o libidinoso, e questões existenciais que expressam indignação, desobediência e transgressão.

 É que, explica ele: “arde em mim / um rio / de palavras / corpo lavas erupção / mar de fogo / vulcão”.  Outra faceta do autor, digna de nota, é a criação de vários heterônimos como sejam Federico Baudelaire, EuGênio Mallarmè ou Gigi Mocidade, talvez a mais irreverente de todos, porque fala a bandeiras despregadas, sem papas na língua. “Muitas vezes a língua pulsa pula para o outro lado do muro outras vezes a língua pira punk nesses tempos obscuros às vezes a língua Dada vai rolando dados nesse jogo duro muitas vezes a língua dark jorra luz nas trevas desse templo escuro”. 

E aqui temos afinal, mais uma obra desse múltiplo e incansável poeta que caminha com uma flor na boca, símbolo universal de amor, de paz e beleza. A ele não importa verdadeiramente por quais meios: “se sou torto não importa / em cada porta risco um ponto / pra revelar os meus destroços / no alfabeto do desterro / a carnadura dos meus ossos”. 

É poética que, para além de perquirir as dores e delícias da condição humana em si, envereda pelo viés de nossa condição social sempre ultrajada. Encontramos um poema que nos pergunta: “quem se alimenta / dessa dor / desse horror / desse holocausto // desse país em ruínas / da exploração dessas minas / defloração desse cabaço // quem avaliza o des(governo / simboliza esse fracasso?” 

Artur Gomes segue sua árdua caminhada, agora com o poderoso concurso da maturidade que lhe chega. Segue emprestando sua voz aos deserdados, aos desnutridos, aos que têm sede, aos que têm fome, ou aos que morrem assassinados nos guetos, nos campos, nas cidades por balas de fuzil, desse país que tarda em referendar a cidadania.

Krishnamurti Góes dos Anjos - Escritor e crítico literário

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TRÊS TOQUES PARA PENETRAR NA NOITE ESCURA  DESTA

PÁTRIA A(R)MADA

 1

Artur Gomes é daqueles poetas que não se contentam em grafar suas palavras apenas nas páginas de um livro. Ele inscreve seus poemas no próprio corpo, na própria voz. Misto de ator saltimbanco e trovador contemporâneo, seus versos ritmados e musicais redobram a força quando saltam do papel para a garganta. O CD Fulinaíma – Sax, Blues Poesia, que gravou em parceria  com os músicos Dalton Freire, Luiz Ribeiro, Naiman e ReubesPess, nos primórdios deste terceiro milênio, é uma das experiências mais bem-sucedidas da fusão entre poesia oralizada e música: os versos lancinantes surgem como navalhas de corte preciso entre os blues, bossas, rocks e baladas. Navalhas que acariciam, mas também cortam a pele do ouvinte.

 Há delícia e dor em sua poética. Uma delícia sensual, sexual, que se explicita em versos como “poderia abrir teu corpo / com os meus dentes / rasgar panos e sedas // com as unhas /arreganhar as tuas fendas / desatar todos os nós // da tua cama arrancar os cobertores / rasgando as rendas dos lençóis”. Há dor por uma terra prometida e sempre adiada, “por uma bandeira arriada / num país que não levanta”. É nesse espaço entre a delícia e a dor que o trovador levanta sua voz e emite seus brasões em alto e bom salto, a plenos pulmões: “eu não tenho pretensões de ser moderno / nem escrevo poesia pensando em ser eterno / veja bem na minha língua as labaredas do inferno / e só use o meu poema com a força de quem xinga”.


2


Cada poeta escolhe sua tribo, reinventa seus ancestrais. A tribo de Artur Gomes vem de uma vasta tradição de trovadores inquietos e inquietantes, hábeis no trato do verso e ferinos no uso do humor, do amor e da revolta. Uma linhagem que vai de Arnaut Daniel a Zé 
Limeira e passa por Oswald de Andrade, Torquato Neto, Paulo Leminski e Uilcon Pereira, para listar alguns.

Cada poeta inventa também o território mítico onde mergulha sua poesia e sua própria vida. Alguns de maneira explícita, outros, mais velada. Há muitos anos surge na poesia de Artur o termo “Fulinaíma”, como uma Macondo espectral, que perpassa livros, sobe aos palcos, atravessa as faixas do CD. Seria um território de folias macunaímicas, uma terra de prazeres e ócios criativos, avessa ao eterno passado colonial que não conseguimos nunca superar, como o fantasma de antigos engenhos em que a “usina / mói a cana / o caldo e o bagaço // usina / mói o braço / a carne o osso // usina / mói o sangue / a fruta e o caroço // tritura suga torce / dos pés até o pescoço”?


3


Artur Gomes é também daqueles poetas que vivem reescrevendo seus poemas, reinserindo-os em outros contextos, reinventando “a poesia que a gente não vive”, aquela mesma que transforma “o tédio em melodia” - para relembrar Cazuza, outro bardo 
pertencente a mesma tribo. Quem acompanha sua trajetóra errante e anárquica provavelmente vai identificar neste livro poemas já publicados em outros – porém, com modificações de tonalidades, de timbres, de intenções.

Se não é despropositado pensar que Dante Alighieri enxertou em sua Divina Comédia inúmeras desavenças políticas, sociais e culturais de sua época e mandou para o inferno pencas de seus inimigos florentinos, é interessante perceber este Pátria A(r)mada reinventado no contexto deste Brasil que retrocedeu décadas depois do golpe político-jurídico-midiático deflagrado em 2016. Esses tempos passarão, é certo, mas este livro ficará – como um potente desconforto, um desajuste, um desconcerto desse mundo cão e chão. Se vale como trágica  profecia – ao modo do cego Tirésias –, após um breve período de sonhos que mais uma vez não se cumpriram, os olhos abertos desses versos ecoarão  nos ouvidos de muitos e cortarão a carne de tantos: “ó, baby, a coisa por aqui não mudou nada / embora sejam outras siglas no emblema / espada continua a ser espada / poema continua a ser poema”.


Ademir Assunção – poetaescritorjornalista e letrista de música brasileira. Autor de livros de poesia, ficção e jornalismo, venceu o Prêmio Jabuti 2013 com A voz do Ventríloquo (Melhor Livro de Poesia do ano). Poemas e contos de sua autoria foram traduzidos para o inglês, espanhol e alemão, e publicados em livros e revistas na Argentina, México, Peru e EUA.

*

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Fome é tema de ensaio fotográfico

 com ossos à venda em bandejas

 

come osso menina come osso menino

não há mais metafísica no mundo

do que comer osso

 

no açougue ou no mercado

osso de graça já foi dado

hoje é vendido hoje é comprado

 

come osso maria come osso mané

come osso joão com arroz e feijão quebrado

 

porque nesse país sem nome temos que comer osso

para matar a nossa fome 

 

já podeis

da pátria, filho

ver demente

a mãe gentil

 

já raiou a liberdade

em cada cano de fuzil

 

salve lindo

fuzil que balança

entre as pernas

a(r)madas da paz

 

a  gripezinha

era a certeza esperança

de um genocida

imbecil incapaz

                                                                                 A

vida

sempre em  suspense

alegria prova dos nove

fanatismo nã0 me convence

muito menos me comove 


Navegar é preciso

  para Fernando Aguiar

 

Aqui redes em pânico

pescam esqueletos no mar

esquadras  descobrimento

espinhas de peixe convento

     cabrálias esperas relento

     escamas secas no prato

       e um cheiro podre no AR

  

caranguejos explodem

   mangues em pólvora


é surreal a nossa realidade

tubarões famintos devoram cadáveres

em nossa sala de jantar

 

como levar o   barco

em meio a essa tempestade

navegar é preciso

mas está dificilíssimo navegar 


Deus não joga dados

mas a gente lança

sem nem mesmo saber

se alcança

o número que se quer

 

mas como me disse mallarmè

:

- vida não é lance de dedos

A vida é lança de dardos

Deus não arde no fogo

                   mas eu ardo 


poema a(r)mado

 

todo os dias

capino a esperança

escavando outras palavras

no chão desse quintal

 

e quando escrevo com enxada

                   o poema é mais real 


cacomanga

 

na roça desde cedo comecei a escavar palavras e separar uma das outras de acordo com o seu significado dar farelo de milho para os porcos e olhadura de cana para o gado aprendi que no terreiro não dependo de mercado e para que urbanidade se a cidade não tem paz com a enxada capinei a liberdade e descobri que ditadura        é uma palavra que não cabe nunca mais


quando escrevo e eu mesmo não entendo o significado de uma determinada metáfora lanço a maldita no vento invento outra e vou ao centro do universo e xingo teu nome: garrutio lamparão de bico kabrunco de poema           que não me dá sossego

 

                                                      Federika Lispector 


testamento

 

a tesoura rasga o tecido da carne

enquanto sangra

no processo cirúrgico do poema

corta de cada palavra a sílaba

que não presta

de cada frase a palavra

de cada sílaba a letra morfa

e o poeta vai vivendo no que resta

 

fulinaíma sax blues poesia

 

                     ela era Bruna

em noite de blues rasgado

soltou a voz feito Joplin

num canto desesperado

por ser primeiro de abril

aquele dia marcado

 

a voz rasgou a garganta

da santa loucura santa

com tanta força no canto

que até hoje me lembro

daquela musa na sala

 

com tua boca do inferno

beijando meus dentes na fala


 

 No universo paralelo

Tenho mestrado Bíblico

Em chá de cogumelo

 

                    Federico Baudelaire 

 Pássaros Elétricos

Vivem a vida por um fio

 

                                                 Federika Bezerra


 

                                        Dê livros

                                       Dê Beijos

                                       Dê Lírios

                                  

                                                                  Gigi Mocidade


pan(demônica)

 

passeio os pés descalços sobre covas rasas

contando ossos no poema exposto

                           no sujeito do objeto

tudo isso exposto nesse papo reto

                          segue o passo norte

não leio cartas de suicídio

nem decreto de hospício

na tentação que me conforte

quero matar o genocídio

          pra não morrer antes da morte

 

 metáfora

 

meta dentro meta fora
que a meta desse trem agora
é seta nesse tempo duro
            meta palavra reta
para abrir qualquer trincheira
            na carne seca do futuro 
            meta dentro dessa meta
a chama da lamparina 
com facho de fogo na retina 
pra clarear o fosso escuro


                    Couro Cru & Carne Viva 


terra de santa cruz

I

ao batizarem-te
deram-te o nome:
posto que a tua profissão
é abrir-te em camas
dar-te em ferro
ouro
prata
rios
peixes
minas
mata
deixar que os abutres
devorem-te na carne
o derradeiro verme

  

II

salgado mar de fezes
batendo nas muralhas
do meu sangue confidente
quem botou o branco
na bandeira de alfenas
na certa se esqueceu
das orações dos penitentes
e da corda que estraçalha
com os culhões de Tiradentes

 

III

salve lindo pendão que balança
entre as pernas abertas da paz
tua nobre sifilítica herança
dos rendez-vous de impérios atrás

 

IV

meu coração
é tão hipócrita que não janta
e mais imbecil que ainda canta:
ou
viram

no Ipiranga

às margens plácidas
uma bandeira arriada
num país que não levanta


V

só desfraldando

a bandeira tropicalha
é que a gente avacalha
com as chaves dos mistérios
dessa terra tão servil
tirania sacanagem safadeza
tudo rima uma beleza

com a pátria mãe que nos pariu


1º de Abril

 

telefonaram-me
avisando-me que vinhas
na noite uma estrela
ainda brigava contra a escuridão

na rua sob patas
tombavam homens indefesos

esperei-te 20 anos
até hoje não vieste à minha porta


VI

o poeta estraçalha a bandeira
raia o sol marginal quarta feira
na Geléia Geral brasileira
o céu de abril não é de anil
nem general é my Brazyl

minha verde/amarela esperança
Portugal já vendeu para França
e coração latino balança
entre o mar do dólar do norte
e o chão dos cruzeiros do sul

            

VII

o poeta esfrangalha a bandeira
raia o sol marginal sexta feira
nesta porra estrangeira e azul
que há muito índio dizia:


meu coração marçal tupã
sangra tupy & rock and roll
meu sangue tupiniquim
em corpo tupinambá
samba jongo maculelê
maracatu boi bumbá

a veia de curumim
é coca cola & guaraná


 VIII

o sangue rola no parque
o sonho ralo no tanque
nada a ver com tipo dark
e muito menos com punk
meu vício letal é baiafro
com ódio mortal de yank

IX

ó baby a coisa por aqui  não mudou nada
embora sejam outras  siglas no emblema

                     espada continua a ser espada 

                   poema continua a ser poema

                     

BraZílica Pereira

 

neste país de fogo & palha
se falta lenha na fornalha
uma mordaz língua não falha
cospe grosso na panela
da imperial tropicanalha

não metam nestes planos
verdes/amarelos
meus dentes vãos/armados
nem foices nem martelos
meus dentes encarnados
alvos brancos belos
já estão desenganados
   desta sopa de farelos


 

GENITAL

 

pasto no cosmo a soja secular de Jardinópolis

onde os discos-voadores sobrevoam meu nariz

                                           na cara das metrópoles.

 

no centro ao sul os cemitérios

possuem mais mistérios

que a nossa vã filosofia.

 

tem um animal de vagina espacial

na poesia & e um grande pênis roxo

milenar feito espiral em círculo

preparando imenso orgasmo

pra festejar o fim do século.


PESSOA

 

não tenho pretensões

de ser moderno

nem escrevo poesia

pensando em ser eterno.

 

veja na minha língua

as labaredas do inferno

e só use o meu poema

com a força de quem xinga.

 


  TROPICALIRISMO

 

GIRAssóis pousando

Nu – teu corpo: festa

beija-flor seresta

         poesia fosse

 

esse sol que emana no teu fogo farto

lambuzando a uva  de saliva doce.

 

LENÇÓIS DE RENDA

 

poderia abrir teu corpo com os meus dentes

rasgar panos e sedas

com as unhas arreganhar as tuas fendas

desatar todos os nós

da tua cama arrancar os cobertores

rasgando as rendas dos lençóis

 

perpetuar a ferro e fogo

minhas marcas no teu útero

meus desejos imorais

maldizendo a hora soberana

com a força sobre humana dos mortais

quando vens me oferecer migalha e fruto

como quem dá de comer aos animais

 


ALUCINAÇÕES (IN)TERPOÉTICAS

 

O QUE é que mora em tua boca bia? um deus. um anjo. ou muitos dentes claros como os olhos do diabo e uma estrela como guia?

O QUE é que arde em tua boca bia? azeite sal pimenta e alho résteas de cebola um cheiro azedo de cozinha tua boca é como a minha?

 

O QUE é que pulsa em tua boca bia? mar de eternas ondas que covardes não navegam, rios de águas sujas onde os peixes se apagam.

ou um fogo cada vez mais Dante como este em minha boca de poeta delirante  nesta noite cada vez mais dia em que acendo os meus infernos em tua boca bia?

 

LUNÁTICA

 

um gato noturno atira pedras nas estrelas

palavras e mais palavras na carne da princesa.

 onde o papel não bate onde o pincel não toca.

 

o gato noturno lambe a barriga

bem perto da virilha e trepa

no muro mais próximo

tentando alcançar o outro lado da lua

em seu instante letal

de desespero       e                       solidão. 


FROYDIANA

 

           azul são os teus olhos

a cor dos pelos não conheço

  teus seios ainda não toquei

 

Dracena – é uma terra roxa

nave extra terrena

que humanos não decifraram

pequena vagina virgem

onde os dedos ainda não entraram

 

e os cachos de uvas apodrecem nos teus dentes

com um cheiro de leite ardente esguichando na distância.

 

pátria a(r)mada

 

só me queira assim caçado

mestiço vadio latino

leão feroz cão danado

perturbando o seu destino

 

e só me queira encapetado

profanando aqueles hinos

malandro moleque safado

depravando os seus meninos

 

só me queira enfeitiçado

veloz macio felino

em pelo nu depravado

em sua cama sol à pino

 

e só me queira desalmado

cão algoz e assassino

duplamente descarado

quando escrevo e não assino 


alguma poesia 


 não bastaria a poesia deste bonde
que despenca lua nos meus cílios
num trapézio de pingentes onde a lapa
carregada de pivetes nos seus arcos
ferindo a fria noite como um tapa
vai fazendo amor por entre os trilhos.


não bastaria a poesia cristalina
se rasgando o corpo estão muitas meninas
tentando a sorte em cada porta de metrô
e nós poetas desvendando palavrinhas
vamos dançando uma vertigem
no tal circo voador.


não bastaria todo riso pelas praças
nem o amor que os pombos tecem pelos milhos
com os pardais despedaçando nas vidraças
e as mulheres cuidando dos seus filhos

 não bastaria delirar Copacabana

e esta coisa de sal que não me engana
a lua na carne navalhando um charme gay
e um cheiro de fêmea no ar devorador

aparentando realismo hipermoderno
num corpo de anjo que não foi meu deus quem fez
esse gosto de coisa do inferno
como provar do amor no posto seis
numa cósmica e profana poesia
entre as pedras e o mar do Arpoador
mistura de feitiço e fantasia
em altas ondas de mistérios que são vossos

 

 não bastaria toda poesia

que eu trago em minha alma um tanto porca,

este postal com uma imagem meio Lorca:
um bondinho aterrissando lá na Urca
e esta cidade deitando água em meus destroços
pois se o cristo redentor  deixasse a pedra
na certa nunca mais rezaria padre-nossos
e  na certa só faria poesia com os meus ossos.

 

                      Suor & Cio 

 Indigesta

 

ê fome negra incessante

febre voraz gigante

ê terra de tanta cruz

 

onde se deu 1ª missa

 índio rima com carniça

no pasto pros urubus

 

oh! My  Brazyl  ainda em alto mar  

Cabral quando te viu foi logo gritando:  

 

- Terra à  Vista!

 e de bandeja te entregando

 pra união democrática ruralista

por aqui nem só beleza  nesses dias de paupéria
nação de tanta riqueza        país de tanta miséria


Tecidos sobre a Terra

Terra,

antes que alguém morra escrevo prevendo a morte arriscando a vida antes que seja tarde e que a língua da minha boca não cubra mais tua ferida

 entre aberto em teus ofícios é que meu peito de poeta sangra ao corte das navalhas e minha veia mais aberta é mais um rio que se espalha

 amada de muitos sonhos e pouco sexo deposito a minha boca no teu cio e uma semente fértil nos teus seios como um rio  

o que me dói é ver-te devorada por estranhos olhos e deter impulsos por fidelidade 

ó terra incestuosa de prazer e gestos não me prendo ao laço dos teus comandantes só me enterro à fundo nos teus vagabundos com um prazer de fera e um punhal diamante 

minha terra é de senzalas tantas enterra em ti milhões de outras esperanças soterra em teus grilhões a voz que tenta – avança plantada em ti como canavial que a foice corta mas cravado em ti me ponho a luta mesmo sabendo – o vão estreito em cada porta


MOENDA

Usina 

mói a cana
o caldo e o bagaço

Usina mói 

o braço
a carne o osso

Usina
mói o sangue 

a fruta e o caroço
tritura suga torce
dos pés até o pescoço

e do alto da casa grande
os donos do engenho controlam

:

o saldo e o lucro

 

carne proibida

 

o preço atual

proíbes que me comas

mas pra ti estou de graça

pra ti não tenho preço

sou eu quem me ofereço

a ti: músculo e osso

        leva-me à boca

e completa o teu almoço


BraziLíricaPereira :

 A Traição das Metáforas 


  1968


ou

: a investigação

uilcorneana

 

 

quem és tu Uilcon Pereira

que foste fazer na Sorbonne?

 

ter aulas com Sartre

ou cantar a Simone? 

drummundana itabirina

 

fedra margarida a resolvida desfilava pela última vez portando falo. Decidira decepar o pênis e desnudar de vez a sua outra mulher. braziLírica amanheceu incrédula: manchetes, vozerios, falatórios, assembleias, faixas, cartazes. por todas as vias, multivias, multimeios, os ofendidos habitantes brazilíricos inconformados com a fedra passearam em plebiscito vociferando Não ao Sim.

 

E margarida flor impávida lá se foi beira-mar olhando estrelas no cruzeiro. Mas César que não é Castro continuou a pigmentar seu mastro na outra parte da tela, e um dia fedra sorrindo, com o pênis/baton da louca, foi ao boca de luar da fedra e voltou com o luar na boca. 


 poema 1

 

entre a pele e a flor no asco com meia sola no sapato o meu vapor mais que barato industrial e infonáutico entre o couro de zinco e o cabelo mar de indecifrável plástico por entre o bronze dos teus pelos entre o gozar cibernético em todo sangue magnético a minha carne pós poeira entre a flor e  o vaso de barro na homepage ou no carro na camisinha de vênus vírus H corroendo em vita/plus ou na sala meu olho gótico TVendo BraziLírica lâmpada fala por um tanto ou tanto quase cento e dez em cada fase não sendo assim acaba sendo


poema 2

 

debaixo da sacada a escada torta pássaro sem teto acima do delírio coração de porco crava no oco da noite a faca cega, punhal de cinco estrelas na constelação do cão maior por onde Úrsula nua passeia Dédala de Dandi Deusa de Dali lua de Dadá no coração do pintor sem fronteiras acima do pé de abóbora embaixo do pé de cajá Malásia não é aqui Espanha não além mar Salvador não é Dali a mulher que eu quero mesmo é uma Dedé que não Dadá Bia de Dante do inferno Itamarati/Itamaracá constelação ursa maior pra Dadá meu coração pra Dedé não sou cantor quando quero quero mesmo espuma nylon pele tecido isopor.


poundianna

 

Torquato era uma poeta que amou a Ana Leminski profeta Que amou Alice um dia pós veio Uilcon torto pegou a Jóia di Ana juntou na PereirAlice com o corpo de alma das duas foi Bouvoir Assombradado pra lá de França ou Bahia roendo o osso do mito pois tudo que Sartre dizia o Anjo jurou já ter dito

Nonada

:

-  Biúte ria


poema seis

 

 

estando quase

sempre e mesmo

estando

esteja breve

assim

como uma letra

escrita a lápis

numa estrela

aquarela rabiscada a giz

 

estando por um raio

esteja por um triz



curto circuito

quem disse que amor
é mudo surdo cego
não sabe o que carrego

em meu estado de sítio

em meu instante  de surto


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