terça-feira, 5 de outubro de 2021

Deus não joga Dados



Deus não joga dados

Mas a gente lança

tenta – em arte tudo se inventa

 

 Eu tenho flores

com a língua atravessada em cada canto da boca

                     EuGênio Mallarmè

 

 Dê  Livros

Dê  Beijos

Dê  Lírios 

Delicadezas

para Sofia Brito

 

Bebo teus olhos atlânticos

e tua voz portuguesa

como quem bebe no Tejo

saudades de Lisboa

 

caminho com os teus passos

em direção ao poema do desassossego

Florbela Espanca Alberto Caieiro Fernando Pessoa

 


 Baudelíricas Baudeléricas

 

o poema uma beijo em tua boca bruna tem um B entranhado entre as coxas a pele das amoras gemem quando venta forte em tuas fêmeas pelas ventas  hoje comi duas nessa manhã incendiária quando vim da cacomanga trouxe nos bolsos da calça remendada linha carretel cola de trigo cerol bambu papel de pipa pique bandeira pique esconde jabuti preá da índia pés de abóboras replantáveis o pé de abacate ainda não nasceu Isadora chegou ontem 30 de março numa tarde outono à sol aberto noite gelada frio na medula maya ainda escreve sobre depressão no tempo falks may abriu as asas pra malásia e a outra mora do outro lado em outra terra rio grande muito longe tenho sede

 

                                             Federico Baudelaire 


As vezes me re-par-to mul-ti-pli-co em 7 alegria noves fora nada tudo é baudelérico fedederico me dizia leonardo fez 80 afonso 84 na rede somos 3 quando ele vem já somos 4 em temporais escrevo e sangro como boi antes da morte muitos outros já se foram e nem gozaram em 69 se eu me lembrar 64 não posso esquecer 68 era uma noite de maio peguei o trem pra são cristóvão depois avião para brasília quando voltei no espelho dédala estava dentro da tipografia




Em 1995 no Centro Cultural Maria Antônia, na USP, assisti uma encenação de Cacá de Carvalho, com texto de Pirandello que me pegou da medula ao osso. A plateia era de 40 pessoas apenas e Cacá circulava entre nós com a sua energia pulsante magnética. O texto era um fragmento da trilogia que ele deu o título  O Homem Com A Flor Na Boca. E a ele, Cacá de Carvalho, dedicamos este livro.

  

Ofício de Poeta

 

franzir a noite

é o mesmo que bordar o dia

costuro o tempo

com linha de pescar moinhos de vento

entre o franzido e o bordado

escrevo um desenredo

e vou foto.grafando

filmando poesia

na solidão dos meus brinquedos

 

 II

 

costuro arco-íris

com linhas de bordar

teus olhos d´água

 

III

 

pego na enxada diariamente

para capinar o quintal

da estação três cinco três

 

literalmente

 

não é metáfora

para lamber cio da terra

como na canção que Chico fez

 

 IV

 

a poesia as vezes me vem da fala

outras de vozes absurdas

na travessia cantei pontos de Jongo

em Folias de Reis Festas Juninas

despachos de Macumba

para me defender dos capataz

nunca vivi porto seguro

na minha praia não tem cais

escrevo como falo aprendi com os ancestrais

 

 V    


com uma câmera nas mãos   

um poema na cabeça

vamos filmar o poema

antes que desapareça

 

A folha de papel em branco sobrevoa a transparência diante do espelho onde me espreitam dois grandes olhos  feito jabuticabas de um pomar que inda procuro a palavra escrita ainda não dita de um desejo impuro e a folha branca de papel pousa em tuas mãos como um pássaro não nascido ainda vindo do futuro. 

 

 

carne proibida 2

 

abusas no meu e-mail

no centro de gravidade

desse meu corpo elétrico

 

não me dissestes porque veio

acender a lâmpada

na metafísica dos poros

 

devoro teu corpo atlântico

com meu canino esquerdo

 

minha fome é quântica

como um barril de pólvora

com o pavio aceso

 

II

salsa alecrim alfavaca cebolinha

azeite limão hortelã vinagre

azeite com pimenta

 

quem resiste esse peixe temperado

que a poesia em mim inventra

 

vem lambe minha língua

que esse me(u)l sal te alimenta


tempestade/temporais

 

eu sou avesso atravesso a cidade

com o que me interessa

as vezes sou sossego outras vezes tenho pressa

 

não procuro o que não quero

me abstenho no que faço

me abstrato quando posso

me concreto em cada passo

 

o compasso é argamassa

o absinto quando traço

uma linha nunca reta

da palavra em descompasso

 

se sou torto não importa

em cada porta risco um ponto

pra revelar os meus destroços

no alfabeto do desterro

a carnadura dos meus ossos

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